28.jun.2015 - O reverendo Wilfredo De Jesus, também conhecido como Pastor Choco, reza com fiéis na New Live Covenant Church, em Chicago, nos EUA
O tom do culto foi definido no início. Uma oração de abertura declarou que se tratava de "um dia sombrio". O sermão girou em torno de um salmo de lamentação. Na metade, um pastor leu uma declaração dizendo que os anciãos e funcionários da igreja estavam "profundamente tristes".
No centro de Chicago, como em várias outras cidades do país, o domingo foi marcado pela alegria, as festas anuais do orgulho gay tiveram mais motivo para celebrar com a decisão de sexta-feira da Suprema Corte dos EUA, que legalizou o casamento entre pessoas de mesmo sexo em todo o país.
Mas aqui na Igreja Wheaton Bible, uma congregação evangélica que atrai cerca de 2.600 pessoas para seus cinco cultos de fim de semana, foi um dia de tristeza.
"Eu vim com uma grande sensação de lamento, por causa do que aconteceu na sexta-feira", disse o pastor Lon Allison, professor da igreja, aos fiéis antes de ler um comunicado declarando: "não podemos aceitar ou aderir a qualquer redefinição legal, política ou cultural do casamento bíblico, nem vamos realizar ou endossar cerimônias de casamento entre pessoas de mesmo sexo."
A mudança dramática da opinião pública, e agora das leis do país, deixou os protestantes evangélicos, que representam cerca de um quarto da população dos EUA, em uma posição desconfortável.
Fora de sintonia com a sociedade em geral, e muitas vezes ridicularizados como preconceituosos e odiosos, muitos estão se sentindo coagidos enquanto tentam viver de acordo com sua compreensão dos ensinamentos bíblicos, e temem que uma mudança no cenário jurídico quanto aos direitos dos homossexuais leve inevitavelmente à restrição da liberdade religiosa.
Mas os desafios não são apenas externos. Até um ponto que raramente é reconhecido em praça pública, muitas igrejas evangélicas também estão se debatendo com questões internas.
Especialmente perto das grandes áreas urbanas, os pastores relatam que cada vez mais cristãos declaradamente homossexuais estão optando por frequentar congregações evangélicas ("cada vez mais estão vindo para a nossa igreja", disse Allison) e que os fieis heterossexuais que têm amigos ou parentes homossexuais estão confrontando a postura da igreja.
"Há um desejo crescente por parte de alguns, até mesmo dentro da igreja, de combinar a fé cristã com a aceitação da prática homossexual", reconheceu a declaração da igreja Wheaton.
O resultado tem sido uma mudança evidente no tom e na ênfase – mas não nos ensinamentos ou na política – de muitas igrejas. Quase todas as igrejas evangélicas se opõem ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, e muitas não permitem que gays e lésbicas atuem em posições de liderança a menos que sejam celibatários.
Alguns pastores, contudo, agora querem minimizar a pregação sobre o assunto ou falar da homossexualidade em sermões cuidadosamente contextualizados, enfatizando que todas as pessoas são pecadoras e que os cristãos devem amar e acolher a todos.
"Os evangélicos estão percebendo que eles têm uma visão minoritária na cultura, e que nesta questão eles perderam a vantagem de jogar em casa", disse Ed Stetzer, diretor executivo da LifeWay Research, que pesquisa os evangélicos. "Eles estão aprendendo a falar de forma elegante e afável, coisa que, quando sua visão era majoritária, não costumavam fazer."
Um punhado de igrejas evangélicas mudou de posição.
A igreja da cidade de San Francisco, por exemplo, derrubou sua regra de que os gays e lésbicas tinham de se comprometer com o celibato para se tornarem membros, e a Igreja GracePointe, no Tennessee, disse que gays e lésbicas podem atuar em cargos de liderança e receber o sacramento do matrimônio.
Ken Wilson, que fundou a Igreja Vineyard em Ann Arbor, Michigan, publicou uma carta aberta pedindo que haja uma maior aceitação de gays e lésbicas nas igrejas evangélicas. Mas Stetzer disse que eles são exceções.
"Evangélicos conhecidos que mudaram de ideia quanto ao casamento gay, você poderia colocar todos numa SUV", disse Stetzer. "Se você mudar, você se torna uma celebridade na mídia, mas a mudança entre os evangélicos praticantes é mínima."
As pesquisas sustentam essa afirmação.
Mesmo em uma época em que a maioria dos norte-americanos, inclusive a maioria de católicos e protestantes brancos, apoia o casamento gay, entre os evangélicos brancos apenas 27% são a favor, enquanto 70% se opõem, de acordo com o Pew Research Center.
"Apenas porque é legal não significa que é ético", disse o reverendo Wilfredo De Jesús, o pastor sênior da New Life Covenant Church, uma megaigreja da Assembleia de Deus com cerca de 20 mil membros em vários campi, a maioria deles em Chicago.
A decisão do tribunal não foi uma total surpresa, é claro. A igreja Wheaton começou a trabalhar em sua declaração na quinta-feira, antecipando a decisão. E o casamento homossexual já era legalizado em Illinois, como em muitos outros Estados, antes da decisão da Suprema Corte; ele foi legalizado no estado no ano passado.
Na Wheaton, no domingo, Allison disse que quando estava lendo a declaração que reiterava a oposição de sua igreja ao casamento entre pessoas de mesmo sexo, olhou para a multidão e adivinhou que 5% a 10% dos presentes discordavam.
Entrevistas na lanchonete da igreja sustentaram isso: mesmo quando ele estava à frente do culto da noite, alguns participantes do culto anterior disseram que não compartilhavam da reação da igreja à decisão da Suprema Corte.
"Não é um dia triste. É um dia feliz", disse um deles, que pediu para não ser citado pelo nome, enquanto discordava de um líder da igreja que pregava na sala ao lado. "O tribunal tomou a decisão certa", disse outro.
Muitos outros entrevistados disseram apoiar a posição da igreja de que o casamento deve ser reservado para casais de pessoas de sexos opostos.
John Mulsoff, 66, que estava brincando com o neto, com uma Bíblia no braço durante o intervalo da manhã, disse que ele e sua mulher discutiu a questão durante uma longa viagem de carro no dia anterior.
"Estou muito confuso sobre isso", disse ele. "Eu acredito, como a nossa igreja, que o casamento deve ser entre um homem e uma mulher, mas eu não acredito na discriminação, e eu não sei dizer como eu lidaria om isso se tivesse um filho ou uma filha nessa situação."
Claudia Velazquez, 21, disse: "eu não concordo com a legalização, mas eu respeito os seres humanos. Isso não diminui o caráter de alguém, e no fim eles também foram criados por Deus."
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