Vimos como pouco depois do seu início, as igrejas de Deus foram prejudicadas com a doutrina dos nicolaítas, o clericalismo, que desenvolveu um ritualismo destruidor da livre compreensão e obediência às Escrituras. Com a Reforma Protestante as igrejas em grande parte se livraram do ritualismo, mas o clericalismo ficou nas maiores instituições.
Enquanto anteriormente as Escrituras haviam sido escondidas, elas agora estavam disponíveis, traduzidas no idioma do povo, a baixo preço para o alcance de todos. O inimigo, portanto, esforçou-se para desacreditá-las.
No século 19 surgiu o racionalismo. O racionalismo põe de lado a revelação divina das Escrituras, assume que a mente humana, a Razão, é suficiente para que o homem encontre a verdade e consiga maior bem. O avanço científico sem precedentes deu uma melhor compreensão do trabalho de Deus na criação, mas também fez com que alguns desejassem explicar a criação sem levar em conta a presença de Deus.
Com isso foi necessário provar que o relato sobre a criação dado no livro de Gênesis não veio de inspiração divina, mas da ignorância de homens que, por terem vivido muito antes dos nossos tempos, saberiam muito menos do que nós. À medida que se faziam novas descobertas, novas teorias surgiam sobre como teria sido a criação, culminando com a publicação “A Origem das Espécies” de Charles Darwin em 1859.
Os que vieram a crer na teoria de evolução (que tem sido mudada incontáveis vezes depois de Darwin) abandonaram a fé na Bíblia como livro inspirado palavra-por-palavra por Deus no original. A Bíblia começa pela criação do mundo em seis dias, do homem e do seu pecado original. Se isso não for um fato real, deixa de haver necessidade da sua redenção. Para esses, portanto, o Evangelho não tem sentido, nem o novo nascimento.
Uma ala dos racionalistas entende que não há revelação inspirada, não há um Criador, nem um Filho de Deus que se fez homem por amor de pecadores para que, pela Sua morte e ressurreição, pudesse abrir o caminho de volta a Deus.
Concomitantemente, foi feito outro ataque à Bíblia mediante a crítica do seu texto. Não se pode negar que é de interesse para todos nós o estudo dos novos textos antigos que vieram à tona durante o século 19, a descoberta das circunstâncias históricas e geográficas em que os vários livros da Bíblia foram escritos, bem como o exame do seu conteúdo literário, com isto aprendendo mais sobre a sua origem.
Mas os racionalistas têm feito um exame frio das Escrituras, considerando apenas os seus autores humanos, sem levar em conta o seu Autor divino, e disto surgiram várias teorias estranhas, por exemplo: a existência de autores diferentes de porções bíblicas em cada livro, o obscurecimento da personalidade de Moisés, a rejeição de milagres alegando que surgiram de mau entendimento, a negação da existência de Abraão e outros vultos do Velho Testamento alegando que eram personalidades mitológicas, etc.
Essas teorias levaram muitos a duvidar do texto bíblico, e a adaptar a sua doutrina, reduzindo Jesus Cristo a um bom homem que foi mal entendido, mas um exemplo para ser seguido. Prometem que seus ensinos nos tornarão em melhores pessoas, elevarão a moral e poderão trazer paz universal, prosperidade e espírito de irmandade. A esperança da volta do Senhor para governar o mundo não é deles, pois não crêem na Pessoa que veio.
Em retrospecto, vemos agora que:
- O ritualismo acrescentou tradição ao conteúdo bíblico, deu à tradição mais importância e depois escondeu a Bíblia para que ficasse apenas a tradição.
- O racionalismo procurou invalidar a Bíblia:
- aceitando a teoria da evolução das espécies, portanto negando o pecado original por Adão e pondo em dúvida até mesmo a existência de Deus
- negando a inspiração divina do texto das Escrituras, pondo em dúvida os escritores e relegando a fábulas grande parte do seu conteúdo. Efetivamente tirou porções da Bíblia, minando e destruindo a sua credibilidade.
A alta crítica trouxe divisões dentro das igrejas anglicanas, presbiterianas, metodistas e outras. As igrejas que permaneceram crentes na inspiração bíblica e obedientes ao seu texto passaram a ser conhecidas como “evangélicas” no século passado, embora continuando com a mesma denominação original.
Os mórmons
Esta não é uma seita cristã, embora adotem o nome de “Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias”.Começou no século 19, nos EUA, com um homem chamado Joseph Smith, analfabeto e de má reputação. Ele não só era um mentiroso destituído de consciência, mas também usava de um linguajar sórdido e se comportava com uma indecência indescritível. Fugindo dos agentes da lei que o procuravam por causa das suas fraudes, ele se instalou fora do alcance deles no estado de Illinois, e ali tomou para si diversas “esposas”. Sendo já fundador e líder da sua “igreja”, ele justificou sua atuação mediante uma “revelação” conveniente, nauseante em seu conteúdo.
Joseph Smith fundou a “igreja” de Mórmon, declarando-se vidente, tradutor, profeta, apóstolo de Jesus Cristo, e ancião da Igreja. Seu fim foi trágico: uma vez, com seu cúmplice chamado Rigdon (um charlatão que começou como pastor batista) teve que fugir da polícia por ter obtido dinheiro fraudulentamente emitindo ações de um banco inexistente. Após mais logros o principal dos seus acompanhantes ameaçou denunciá-lo, o que deu início a uma briga resultando em seu aprisionamento. A multidão, enfurecida, invadiu a prisão e o matou. Infelizmente isso deu aos seus acompanhantes a oportunidade de declarar que ele fora martirizado!
Quando Joseph Smith morreu, Brigham Young, que se denominava “o maior dos doze apóstolos” excomungou seu comparsa Rigdon, e fugiu com os membros da “igreja” em 1847 para o estado de Utah (naquele tempo pertencente ao México) para escapar das leis dos Estados Unidos, contrárias à poligamia e outras práticas. Eles se estabeleceram em Salt Lake City, e Brigham Young morreu em 1877 deixando uma fortuna imensa, 17 esposas e 56 filhos e filhas. Quando Utah passou a pertencer aos Estados Unidos, eles tiveram que se submeter às suas leis, mas a poligamia ainda faz parte de suas doutrinas, e muitos a praticam às escondidas nos países onde as leis não a permitem.
Os mórmons baseiam toda a sua doutrina no que chamam de Livro Sagrado de Mórmon, e no seu Livro das Doutrinas e Alianças.
- O Livro de Mórmon foi ditado, segundo dizem, por detrás de uma cortina, por Joseph Smith primeiramente a Martin Harris e depois a Oliver Cowdery, todos norte-americanos. Joseph Smith alegou que um anjo mostrou-lhe onde estavam enterradas umas tabuinhas de ouro escritas em língua desconhecida, e lhe deu dois cristais chamados Urim e Tumim, mediante os quais ele podia ler em inglês o conteúdo das tabuinhas, e isto foi o que ele ditou. Terminado o ditado, disse ele, as tabuinhas e os cristais foram levados pelo anjo, e assim ninguém mais os viu senão ele.
- O Livro das Doutrinas e Alianças contém, entre outras coisas, uma nova “revelação” que Joseph Smith disse ter recebido, justificando sua poligamia.
- As mais repugnantes “interpretações” são dadas aos fatos e doutrinas bíblicas. Por exemplo, ensinam que Deus é um homem exaltado, sempre melhorando, mas nunca perfeito, feito de carne e ossos como nós; Joseph Smith insistia que Deus o Pai viveu no mundo, assim como Jesus Cristo, e seu sucessor Brigham Young, ainda mais venerado que ele pela “igreja”, esclarece que Adão é Deus, o supremo Deus. E muito, muito mais desse gênero.
No mormonismo existem dois elementos que obrigam seus seguidores a não deixá-lo:
- Misticismo: cada Mórmon veste o que chamam de vestidura dotal, contendo algarismos e símbolos de coisas muito importantes para ele. Ele recebe esta vestidura depois de participar de cerimônias secretas em seu templo, e os mórmons não ousam divulgar os segredos que lhes são ensinados ali.
- Batismo pelos mortos: uma das suas muitas doutrinas falsas. Consiste no ensino que ninguém pode ser salvo se não for batizado por eles, e que as almas dos mortos podem ser “libertadas” mediante o batismo de uma pessoa viva em seu lugar! Muitas de suas doutrinas, inclusive esta, só é ensinada à medida que o novato vai progredindo em seu discipulado, durante o qual seus mentores o submetem a juramentos e obrigações religiosas e materiais das quais ele dificilmente poderá escapar. É uma autocracia religiosa por parte dos seus sacerdotes que comandam tanto a vida religiosa, como a vida secular, dos que a ela pertencem.
AS IGREJAS DE DEUS CONFORME
O NOVO TESTAMENTO
O histórico das seitas nos mostra o cumprimento de várias profecias, a partir da parábola do grão de mostarda e da parábola do fermento. A pureza do reino dos céus, representado pela igreja de Cristo visível no mundo, foi contaminada pelo pecado interno e invadida pelas doutrinas diabólicas de tal forma que, se o pecador descrente desejar encontrar a verdade e for procurá-la numa igreja que se chama cristã, ele se verá frustrado pelas denominações existentes e pela grande variedade de doutrinas e práticas que ali vai encontrar.
Como num supermercado, ele vê igrejas para todo o gosto. Mas poucas vão satisfazer a quem realmente procura saciar a sua sede espiritual, pois poucas apresentam a fonte da água viva, a luz do mundo, o caminho, a verdade e a vida que são exclusivamente o Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus. Nenhuma igreja, por maior, melhor, mais espetacular que seja, pode tomar o Seu lugar.
Apenas os Seus discípulos compõem a Sua igreja, que é o seu corpo espiritual aqui na terra. Eles são os que O recebem como seu Senhor e Salvador pessoal e obedecem aos Seus mandamentos, e à doutrina dos Seus apóstolos, como encontramos na Bíblia. As suas congregações, separadas geograficamente, são as igrejas locais que se reúnem em Seu nome.
Essas igrejas locais não são seitas, pois não são um partido religioso, nem são resultado de uma divisão, ou da perversão de um ensino. Elas não seguem o ensino de um homem, mas aprendem e praticam apenas aquilo que nos é revelado por Deus mesmo através da Sua Palavra inspirada, a Bíblia, sem acréscimos ou distorções. Como concluiu Campbell, a comunhão se consegue em “falar quando as Escrituras falam, e silenciar quando as Escrituras silenciam”. Há um poder unificante na verdade, explícita nas Escrituras.
Os discípulos, membros da igreja, não se dividem em classes: são todos iguais, com diferentes qualidades e dons espirituais que usam para benefício do grupo. Não existe um homem ou grupo dominante. A igreja é um organismo em que cada membro tem uma tarefa a cumprir, reconhecida pelos outros. Os que são reconhecidos como idôneos para estar na sua direção servem aos demais nessa posição, contribuindo para o ensino com a sua experiência e exemplo e pastoreando o rebanho pelo qual se tornam responsáveis.
Em matérias onde as Escrituras não são claras, podem existir opiniões diferentes, ou mesmo divergentes. Isto não é motivo para haver divisão ou facções. É motivo para oração a fim de que haja esclarecimento pela ação do Espírito Santo, e também oportunidade para mostrar longanimidade, que é fruto do Espírito.
Igrejas assim têm existido desde as primeiras reunidas pelos apóstolos. Através da história, elas têm surgido pelo mundo como resultado do desejo de obedecer ao Senhor Jesus Cristo e os seus apóstolos apenas, rejeitando as doutrinas e costumes que são estranhas às dos apóstolos, formando-se grupos, alguns muito pequenos, cada um consistindo em uma igreja de Deus.
LIÇÕES
O breve relato sobre o aparecimento das seitas, que expusemos, nos dá as seguintes lições a fim de não nos desviarmos pelo mesmo caminho que elas seguiram:1) Obedecer fielmente ao que a Bíblia ensina, e nada mais. Os judaizantes e os gnósticos foram uma grande ameaça às primeiras igrejas. Temos outras grandes ameaças vindas de fora, ou mesmo de dentro: as tradições, o racionalismo, o pentecostalismo, etc. É o fermento dos fariseus e dos saduceus, contra o qual nos preveniu nosso Mestre, e dá origem a seitas.
2) Não admitir a doutrina dos nicolaítas, odiada pelo Senhor Jesus. A nenhum membro da igreja deve ser permitido destacar-se dos demais a ponto de deitar normas e tomar controle sobre a congregação, o que faz dela uma seita. Lembremos de Diótrefes, um dos pioneiros dessa doutrina, que até recusou receber o apóstolo João (3 João 1:9). Foi assim que surgiu o clericalismo, que extinguiu a liberdade da direção do Espírito Santo na igreja.
3) Não tomar uma denominação para se distinguir das demais igrejas: isto faz dela uma seita. Na igreja de Corinto Paulo combateu severamente os partidos e as denominações que a eles estavam sendo dadas, esclarecendo que eram da carne. Todo crente em Cristo e as igrejas de Deus devem ter comunhão com outros crentes salvos pela sua fé em Cristo. Quem não o fizer estará desobedecendo ao Senhor Jesus que nos mandou amar uns aos outros. A rejeição de comunhão não é compatível com o amor. Uma observação: muitas congregações de santos através da história foram apelidados pelos de fora, e pelos seus inimigos, de nomes que eles próprios rejeitavam, pois queriam ser apenas reconhecidos como cristãos. Os nomes ficaram, pois a história foi quase sempre escrita pelos seus inimigos.
4) Não se reunir com outras igrejas debaixo de uma só administração central, o que seria abandonar o exemplo dado pelas primeiras igrejas apostólicas. De um ponto de vista humano parece dar mais força ao conjunto, mas faz com que cada igreja participante se enfraqueça mais: é confiar na carne e não no Espírito. As igrejas que isto fazem perdem a liberdade que tinham quando dependiam inteiramente da providência de Deus, e se tornam sujeitas à liderança de um poder humano central, com as suas fraquezas. A federação as separa das igrejas que não são participantes, formando-se uma seita, como era a dos catolicistas. Eventualmente forma-se uma instituição religiosa, com os vícios que acompanham tais organizações.
5) Não fazer alianças políticas, ou com associações e agremiações humanas. Como corpo espiritual de Cristo, a igreja não pode se aliar a qualquer órgão “secular”. Fatalmente lhe virão obrigações e ela não pode servir a dois senhores. A igreja que assume tais obrigações torna-se em uma seita. Foi uma das causas fundamentais da ruína da seita católica romana. Tornou-se poderosa no mundo, mas perdeu toda a sua santidade, tendo até que acomodar o paganismo e a idolatria para satisfazer o poder político.
6) Cuidar da saúde espiritual dos membros, para que um não “adoeça” contraindo um pecado que não quer abandonar e contamine os demais com ele. É o fermento de Herodes, contra o qual nos precaveu o Mestre e é também o ensino de Hebreus 12:15: a raiz de amargura é uma citação de Deuteronômio 29:18 e indica o desejo de pecar, que resulta no pecado. Quando alguém resolve fazer o que sabe ser errado, isso se torna como uma raiz que brota sem controle e produz resultados inesperados, tendo repercussões em toda a igreja. É preciso “cortar o mal pela raiz” antes que isso aconteça e a igreja se transforme em uma seita.
7) Finalmente, “seguindo a verdade em caridade, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bem ajustado e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor” (Efésios 4:15,16). Uma igreja que, seguindo a verdade cresce em Cristo, sempre unida pelo amor do tipo daquele que Cristo mostrou por nós, tornar-se-á vigorosa e chegará à maturidade para o bem de seus membros, e para a salvação dos incrédulos mediante o seu testemunho.
“As armas com as quais lutamos não são humanas; ao contrário, são poderosas em Deus para destruir fortalezas. Destruímos argumentos e toda pretensão que se levanta contra o conhecimento de Deus, e levamos cativo todo pensamento, para torná-lo obediente a Cristo” (2 Coríntios 10:4-5 - NVI).
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