quarta-feira, 16 de março de 2016

PROFETA VERDADEIRO

O VERDADEIRO POVO E SEU REI
“De fato, vou ajuntar todos vocês, de Jacó. Sim, vou reunir o remanescente de Israel. Eu os ajuntarei como ovelhas num aprisco, como um rebanho numa pastagem. Haverá o barulho de uma grande multidão. Aquele que abre caminhos irá na frente deles; eles passarão pela porta e sairão. O rei deles, o Senhor, os guiará.
Ouçam, vocês que são líderes em Jacó, governantes na nação de Israel! Vocês deveriam conhecer a justiça! Mas odeiam o bem e amam o mal. Vocês arrancam a pele do meu povo e a carne dos seus ossos. Aqueles que comem a carne do meu povo, arrancam sua pele, despedaçam os seus ossos e os cortam como se fossem carne para a panela um dia clamarão ao Senhor! Mas ele não responderá… Naquele tempo ele esconderá deles o rosto por causa do mal que tem praticado” (Miquéias 2: 12-13 e 3: 1-4)
Assim Miquéias segue não falando o que convém, mas o que é necessário. Falar o necessário, sobre a necessidade, é o que faz o verdadeiro profeta. Miquéias anuncia que o Senhor guiará seu povo, o povo de Jacó, a nação de Israel. A cena descrita parece muito com o que acontece no Êxodo: o Senhor a frente do povo abrindo caminhos para que pudessem passar e sair. Mas porquê o povo deveria sair? No texto anterior, vimos que as cidades estavam corrompidas e que falsos profetas não denunciavam esta corrupção. Vimos que Miquéias falava em determinado tempo para determinados reis. As catástrofes eram sinal da corrupção e os acusados eram os líderes em Samaria e em Jerusalém. Porquê o povo será salvo?
No trecho acima percebemos uma sutileza: existe quem é de Jacó e de Israel e quem “está” em Jacó e “está” em Israel. O povo de Jacó e de Israel será juntado pelo Senhor e sairá daquele lugar corrompido, daquelas cidades feridas. Serão como o rebanho guiado por seu pastor. Diferente daqueles que não são de Jacó e de Israel, mas são chefes e governantes em Jacó, emIsrael. O profeta denuncia um abismo que há entre o povo  e seus líderes: o povo é de Israel, seus chefes e governantes apenas estão por lá…
E o que faz com que esses governantes sejam rejeitados pelo Senhor, não considerados como parte de seu povo? Eles “deveriam conhecer a justiça! Mas odeiam o bem e amam o mal; arrancam a pele do meu povo e a carne dos seus ossos”. Os governantes deveriam conhecer a justiça! Não a conhecem.  Por isso são rejeitados, são excluídos do verdadeiro povo de Israel. Sinal de que o povo enquanto povo conhece a justiça e a pratica; mas é oprimido e mastigado por seus governantes injustos. O povo justo sofre nas mãos de governantes injustos, que arrancam sua pele e a carne de seus ossos.
Claramente o profeta defende o povo e ataca os governantes. O povo romantizado como justo é o verdadeiro povo de Deus; enquanto que os governantes são vistos como opressores que não seguem a justiça divina. Mas quem é o povo? Essa palavra anda muito desgastada e é comumente entendida num sentido pejorativo. Se o profeta defende o povo, que em suas palavras o Senhor chama de “meu povo”, é porque vê esta categoria com bons olhos. Enrique Dussel, tentando resgatar o sentido bom de povo, escreveu: “povo é um ‘bloco comunitário’ dos oprimidos de uma nação […] é o povo como sujeito histórico da formação social, do país ou nação. ‘Povo cubano’, ‘povo nicaraguense’, ‘povo brasileiro’ são os que atravessam a história […] O povo como dominado é massa; como exterioridade ao sistema é reserva escatológica; como revolucionário é construtor da história”. Aqui, o “povo de Jacó” atravessa a história, passará pela porta e sairá guiados pelo Senhor.
Os governantes, distantes do povo e opressores do povo, praticam o mal. Um dia, diz o profeta, clamarão ao Senhor, mas Ele não os responderá. Neste dia estará a frente de seu povo, longe dos líderes que estão em Israel, e esconderá seu rosto enquanto segue em frente…
FORÇA E JUSTIÇA: ONDE O PROFETA SE FIRMA
“Assim diz o Senhor: ‘Profetas que fazem o meu povo se desviar e que proclamam a paz quando lhes dão o que mastigar, mas que proclamam guerra santa contra quem não lhe enche a boca; por tudo isso, a noite virá sobre vocês – uma noite sem visões! Haverá trevas sem adivinhações. O sol se porá e o dia ficará escuro para estes profetas. Os videntes, envergonhados, e os adivinhos constrangidos, todos cobrirão o rosto porque não haverá resposta da parte de Deus’. Quanto a mim, porém, graças ao poder do Espírito do Senhor, estou cheio de força e de justiça para declarar a Jacó sua transgressão e a Israel o seu pecado:” (Miquéias 3: 5-8)
Miquéias denuncia abertamente os líderes, os governantes que estão em Israel. Mas existem outros profetas contemporâneos que não falam o necessário, a verdade, mas praticam o contrário: bendizendo àqueles que lhes dão “o que comer”. No cenário de uma cidade corrompida, onde o povo é oprimido e os governantes denunciados por sua violência e injustiça, temos de imaginar que há pobreza e sofrimento por parte de uns e sobra na casa ou no palácio de outros. Os profetas proclamam a paz àqueles em troca de ter posses, de ter comida, corrompendo sua função de pregar a verdade; e declaram guerra santa contra aqueles que não lhe enchem a boca.  Podemos pensar que ao denunciar os governantes, Miquéias está tirando a possibilidade de sustento e aproveitamento destes profetas. Miquéias está tirando deles o que mastigam. Podemos pensar que estes profetas tem declarado guerra santa contra Miquéias e contra aqueles que são povo e não podem trocar comida por presságios.
O verdadeiro profeta anuncia a vinda de uma noite sem visões enviada pelo Senhor, enquanto denuncia a corrupção até dos profetas. Não dirão mais nada e nem tirarão sustento de seus dons. O Senhor não os responderá – assim como não responderá os governantes. Miquéias faz este comentário, uma pausa, para afirmar e reafirmar sua missão: “declarar a Jacó sua transgressão e a Israel o seu pecado”. Numa mistura de apreensão e esperança, Miquéias diz estar cheio de força e justiça. Ou seja: não se calará! Graças ao Espírito do Senhor, tirará desta força e desta justiça seu sustento: o que o manterá vivo e firme em seu propósito. Ele acaba sendo o único profeta verdadeiro por não se deixar corromper, como os demais profetas estão fazendo…
CORRUPÇÃO GENERALIZADA: ESTA CIDADE NÃO  TEM MAIS JEITO
“Ouçam isto, vocês que são chefes e na descendência de Jacó, governantes na nação de Israel. Vocês que detestam a justiça e pervertem tudo o que é justo: que constroem Sião com derramamento de sangue e Jerusalém com impiedade. Seus líderes julgam sob suborno, seus sacerdotes ensinam visando lucro e seus profetas adivinham em troca de prata. E ainda se apoiam no Senhor! Dizem: ‘o Senhor está no meio de nós; nenhuma desgraça nos acontecerá’. Por isso, por causa de vocês, Sião será arada como um campo, Jerusalém se tornará um monte de entulho e a colina do tempo um verdadeiro matagal” (Miquéias 3: 9-12)
Na força e na justiça vindas do Espírito e que enchem o profeta, Miquéias volta a atacar os governantes e sua corrupção. O povo é redimido, passa em branco. Já as atrocidades dos líderes são plenamente expostas. Os governantes detestam a justiça e pervertem tudo o que é justo – até a Mensagem de esperança, a utopia do povo! Sião e Jerusalém foram cidades-capital importantes na constituição do povo judeu. Mas no processo de formação cultural, deixaram de ser apenas lugares para se tornarem paradigmas, cidades míticas, símbolos da Terra Prometida. O “Monte de Sião” e a “Nova Jerusalém” são sinônimos desse lugar que não tem lugar. U-topia significa “sem lugar”. Estas cidades míticas estão sendo construídas por estes governantes, mas não como lugares utópicos, justos, fonte e destino de esperança. Os governantes “constroem Sião com derramamento de sangue e Jerusalém com impiedade”!
A perversão é tamanha  que até aquilo que era para ser bom, o “lugar perfeito”, o “sonho de Terra Prometida”, está corrompido. Sião é feito com sangue e Jerusalém com impiedade. Onde será o refúgio do povo? Nas mãos destes governantes não existe. Talvez nos tribunais entrando com processos contra o Governo? Não; os juízes julgam sob suborno. Talvez na formação escolar ou religiosa? Não; os sacerdotes ensinam visando o lucro. Talvez com os profetas? Não; como vimos, fazem de suas mensagens produtos no mercado. Não há lugar, não há sossego, não há salvação para este povo! A não ser que o Senhor os ajunte e os guie para sair dali! Jacó-Israel se tornou Egito! A maior corrupção possível! O povo tem que sair de sua própria terra, sua própria casa, pois o lugar que era para ser de liberdade se tornou escravizante.
Assim talvez estejam nossas igrejas. Assim talvez sejam nossos Estados. E qual caminho tomar? Precisamos das denúncias e dos anúncios de verdadeiros profetas… Precisamos de um povo que atravesse a história: que não esteja firmado aqui ou ali, mas na Mensagem, na Utopia, nos caminhos abertos pelo Senhor no curso da História para a “Terra Prometida”.

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