Na definição de Jorge Hage, ministro-chefe da Controladoria-Geral da
União, o Ministério do Trabalho encontra-se em “situação extrema”.
Tornou-se uma pasta extremamente irregular. Em entrevista ao blog, Hage
contou que o ministério comandato pelo PDT desde 2007 mantém convênios
ativos com mais de 20 ONGs irregulares. Abasteceu-as de verbas públicas
sem se importar com as recomendações em contrário feitas pela CGU.
Há
mais: o Ministério do Trabalho descuidou até das aparências. Absteve-se
de analisar a escrituração formal dos acordos firmados com ONGs. “Tem
mais de mil prestações de contas acumuladas”, disse Hage. Há pior:
passando por cima de um decreto de Dilma Rousseff, o ministério livrou
ONGs de fancaria de figurar num cadastro oficial de entidades que, por
inidôneas, não poderiam continuar recebendo dinheiro público.
Vale
a pena ouvir Jorge Hage: “O que foi determinado aos ministérios no
decreto da presidenta Dilma é que, havendo irregularidades, eles
comuniquem à CGU para que a ONG vá para o cadastro de impedidas e,
paralelamente, instaurem a tomada de contas especial. O Ministério do
Trabalho, na grande maioria das vezes, não comunicou a situação
irregular da entidade para nós colocarmos no cadastro.”
O decreto
de Dilma foi editado em 2011, o ano da “faxina”. Um período em que foram
ao olho da rua por corrupção seis ministros, três deles enrolados com
ONGs: o peemedebista Pedro Novais (Turismo), o ‘comunista do B’ Orlando
Silva (Esportes) e o pedetista Carlos Lupi (Trabalho). Depois dessa
“varredura”, afirmou Jorge Hage, todos os ministérios se aprumaram,
menos um. “O caso específico do Ministério do Trabalho diria que talvez
tenha sido o pior dos exemplos. Nós reiteramos inúmeras vezes as
recomendações e elas não foram cumpridas”, declarou o chefe da CGU.
Há
pelo menos quatro anos o feudo do PDT na Esplanada frequenta as
auditorias da CGU de ponta-cabeça. Em 2009 e 2010, último biênio da
gestão Lula, a equipe de Jorge Hage fez ressalvas ao aprovar as contas
do Ministério do Trabalho. Em 2011 e 2012, já sob Dilma, as contas da
pasta receberam o carimbo de “irregular”. Por quê?
“Já não era
possível reiterar as mesmas recomendações que simplesmente não eram
cumpridas”, disse Jorge Hage. “Sempre havia uma desculpa, uma
justificativa para continuar com o convênio… Então, chegou-se a essa
situação extrema.” Dilma sabe de tudo isso?, indagou o repórter. E Hage:
“Ela tem a informação global, geral, como é adequado ao seu nível de
gestão, como maior autoridade do Executivo.”
Embora saiba, no
geral, o que se passa na pasta do Trabalho, a presidente manteve o PDT
no comando das irregularidades. Ao ser ejetado da poltrona, em dezembro
de 2011, Carlos Lupi, presidente do PDT federal, escreveu numa nota:
“…Decidi pedir demissão do cargo que ocupo, em caráter irrevogável. Saio
com a consciência tranquila do dever cumprido, da minha honestidade
pessoal e confiante por acreditar que a verdade sempre vence.”
Dilma
também mandou divulgar uma nota. O texto não ornava com a cena: “A
presidenta agradece a colaboração, o empenho e a dedicação do ministro
Lupi ao longo de seu governo e tem certeza de que ele continuará dando
sua contribuição ao país.” A contribuição de Lupi ao país é até hoje
desconhecida. Mas o auxílio dele a si próprio e ao PDT materializou-se
na figura do também pedetista Paulo Roberto Pinto. Segundo na hierarquia
do Trabalho, ele assumiu interinamente o ministério.
A
interinidade de Paulo Roberto durou cinco meses, até Dilma converter o
deputado Brizola Neto em ministro. Desafeto de Lupi, o neto de Leonel
Brizola teve vida curta no ministério. Há seis meses, rendendo-se às
ameaças de Lupi de fechar com outro presidenciável em 2014, Dilma
permitiu que ele indicasse outro ministro: o catarinense Manoel Dias,
secretário-geral do PDT.
O novo preposto de Lupi devolveu à
cadeira de número 2 da pasta do Trabalho o preposto anterior, Paulo
Roberto Pinto. Nos últimos 15 dias, a Polícia Federal informou ao país
qual foi o resultado da ação entre amigos. Num par de operações —Esopo e
Pronto Emprego— a PF desativou esquemas que transferiram do Trabalho
para a caixa registradora de ONGs algo como R$ 418 milhões. Foram em
cana duas dezenas de pessoas. Manoel Dias tornou-se um ministro
seminovo. Registraram-se baixas na equipe do ministério. Entre os que
caíram, estava Paulo Roberto, o número 2.
Instado a comentar a
emboscada política que se armou contra o contribuinte no Ministério do
Trabalho, Jorge Hage preferiu tomar distância: “Não quero entrar nem
devo entrar na análise política das nomeções, não é parte da minha
competência.” Soou categórico, porém, ao confirmar que as logomarcas que
mobilizam a Polícia Federal a imprensa são frequezas de caderneta da
CGU.
No dizer de Jorge Hage, são ONGs “carimbadas, velhas
conhecidas da nossa auditoria.” Segundo ele, as entidades são
fraudadoras de mostruário. Não há “nenhuma dúvida quanto às
irregularidades cometidas por elas”. Coisas “já apontadas em auditorias
nossas desde 2009, 2010, 2011… Repetidamente, não há surpresa nenhuma
para ninguém.”
A pedido de Manoel Dias, Jorge Hage repassou para o
Ministério do Trabalho uma relação com os nomes das ONGs mais
enroladas. A lista inclui o Instituto Mundial de Desenvolvimento e
Cidadania. Uma usina de devios que drenou das arcas do Tesouro cerca de
R$ 400 milhões. A relação traz anotado também o nome de uma entidade de
Santa Catarina, Estado do ministro. Chama-se ADRVale, abreviação de
Agência de Desenvolvimento Regional do Vale do Rio Tijucas e Itajaí
Mirim.
Numa série de reportagens, o jornal Estado de S.Paulo
demonstrou que a entidade, vinculada ao PDT e ao próprio Manoel Dias,
usou verbas recebidas de Brasília com fins partidários. Esquivando-se de
comentar as vinculações políticas da entidade, Jorge Hage declarou que a
catarinense ADRVale se inclui no rol das “velhas conhecidas da nossa
auditoria”.
Sitiado por tantas organizações “conhecidas”, o
governo só consegue recuperar algo como 15% do dinheiro desviado de seus
cofres, informou Jorge Hage. Para complicar, o cenário econômico de
cintos apertados impõe cortes orçamentários também à CGU. Sem dinheiro
para a passagem e a hospedagem, a Controladoria teve de suspender todas
as auditorias que faria em municípios no interior do país. No dizer de
Jorge Hage, os malfeitores terão um “refresco”.
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