Eis que por ordem do Senhor veio de Judá a Betel um homem de Deus... Morava em Betel um profeta velho... E foi após o homem de Deus e, achando-o sentado debaixo dum carvalho, lhe disse: És tu o homem de Deus que vieste de Judá? Ele respondeu: Eu mesmo. Então lhe disse: Vem comigo a casa, e come pão. Porém ele disse: Não posso voltar contigo, nem entrarei contigo; não comerei pão, nem beberei água contigo neste lugar. Porque me foi dito pela palavra do Senhor: Ali não comerás pão, nem beberás água; nem voltarás pelo caminho por que foste. Tornou-lhe ele: Também eu sou profeta como tu, e um anjo me falou por ordem do Senhor, dizendo: Faze-o voltar contigo a tua casa, para que coma pão e beba água. (Porém mentiu-lhe.) Então voltou ele, e comeu pão em sua casa e bebeu água ... Assim diz o Senhor: Porquanto foste rebelde à palavra do Senhor e não guardaste o mandamento que o Senhor teu Deus te mandara, antes voltaste, e comeste pão e bebeste água no lugar de que te dissera: Não comerás pão nem beberás água; o teu cadáver não entrará ) no sepulcro de teus pais.... (Leia l Reis 13:1-32).
A história registrada em l Reis 13 é por demais trágica e solene. Aqui temos dois homens — um homem de Deus e um profeta velho. Estes dois homens têm sido usados por Deus, mas o fim deles é demasiadamente lamentável. A lição que podemos aprender de suas vidas é muito séria.
Este profeta velho de Betel foi um homem que no passado tinha sido usado por Deus, mas agora já não era usável. Quando Deus desejou prevenir a Jeroboão do seu pecado em Betel, não enviou o profeta velho que morava em Betel para lhe falar; em vez disso, enviou um homem de Deus, de Judá. Isto indica que o profeta velho já não era útil ao Senhor. A palavra "velho" com referência ao profeta não refletia sua maturidade espiritual nem suas ricas experiências espirituais; antes, revelava e descrevia o fato de ser espiritualmente velho e portanto inútil ao serviço do Senhor. Para falar a Jeroboão, o Senhor somente poderia usar o homem de Deus, não o profeta velho. A frase "homem de Deus" denota que tal pessoa tem comunhão com Deus, e a comunhão é a base para a luz de Deus. No momento em que cessa a comunhão, nesse mesmo instante cessa a luz. Este profeta velho já tivera uma história espiritual, pois fora em certo tempo profeta; entretanto, agora havia perdido a comunhão com o Senhor. Tornou-se um profeta velho quando o Senhor já não o podia usar. Esta é uma situação muito séria.
Muitos irmãos e irmãs não fazem progresso espiritual perante o Senhor. Seu estado espiritual é hoje o mesmo que foi há oito ou dez anos. Alguns que possuem boa mente parecem ter feito algum progresso, mas tal progresso não é espiritual. Falam palavras que eles mesmos não compreendem. Tudo o que possuem é conhecimento mental; não há luz verdadeira. Aprenderam muita fraseologia espiritual, entretanto não fazem nenhum progresso espiritual verda-deiro perante o Senhor. Pode ser que dez anos atrás você tenha encontrado alguém que possuía uma pequena luz, e então pensou que essa pessoa estava com boa saúde perante Deus. Mas hoje, dez anos mais tarde, você descobre que ela não possui luz nova de modo algum e não fez nenhum progresso espiritual. Essa pessoa é profeta, mas profeta velho a quem Deus é incapaz de comunicar qualquer coisa. Não nos esqueçamos aqui que Deus trabalha sem cessar: "Meu Pai trabalha até agora", diz o Senhor Jesus, "e eu trabalho também" (João 5:17). A luz que recebemos vinte, dez, ou até mesmo cinco anos atrás já não é adequada para guiar-nos hoje.
Em vista disto, devemos dar atenção a uma questão muito importante em nossa caminhada cristã — isto é, como não ser posto de lado por Deus, como não ser rejeitado ou permanecer sem ser usado. Nosso frescor perante Deus é um hábito mui vital. Deve ser estabelecido e mantido. Mas com muita frequência somos velhos demais ou pobres demais espiritualmente.
Como diz a história, o profeta velho vivia em Betel. Qual era a situação aí nessa época? Em Betel, Jeroboão oferecia sacrifício ao bezerro que ele próprio havia fundido. Ordenava sacerdotes que não eram da tribo de Levi e arbitrariamente escolhia meses e dias para queimar incenso sobre o altar (veja 1 Reis 12:28-33). Além disso, estabeleceu lugares de adoração além do prescrito por Deus, que era Jerusalém, porque temia que o povo do Reino do Norte continuasse indo a Jerusalém a oferecer sacrifícios no santo templo ali, e desta forma seu reino seria enfraquecido. Embora ele não adorasse outros deuses mas ainda adorasse ao Deus que havia tirado os filhos de Israel do Egito, entretanto adorava fora de Jerusalém por sua própria vontade. Isto fora condenado pelo Senhor. Portanto, todas as suas ações eram pecados e transgressões contra Deus. O que é mais, ele não somente pecou mas também influenciou outros reis depois dele a cometerem o mesmo pecado (veja, por exemplo, l Reis 16:19, 31; 22:52; 2 Reis 13:2). Por isso os pecados de Jeroboão em Betel eram muito sérios.
Agora lembre-se de novo que o profeta velho vivia em Betel; e o que Jeroboão havia feito e continuava a fazer era feito perante os olhos deste profeta velho; e mesmo assim o profeta velho falhou em reconhecer o seu caráter pecaminoso. Tal estado, devemos reconhecer, era deveras sério. Ora, um profeta só pode falar por Deus porque conhece a mente de Deus. E aqui estava um profeta velho que não tinha nenhum conhecimento da mente de Deus, pois é óbvio que aquele que não pode ser enviado por Deus para falar por ele não conhece a mente de Deus. De modo que o Senhor teve de enviar em seu lugar o homem de Deus.
O profeta velho falhou em perceber que a adoração que se prestava em Betel era pecaminosa. Este fato provou conclusivamente que já havia alguma coisa errada com ele. Se chegarmos à conclusão de que tudo está muito bem — que o culto de Jerusalém é bom e que a adoração de Betel também é boa — é prova de que não percebemos o erro e que algo está radicalmente errado conosco.
Há muitos iguais ao profeta velho. Seus olhos estão embaçados e defeituosos. Não vêem o que é pecaminoso à vista de Deus. Presumem que enquanto o Senhor estiver recebendo adoração, que diferença faz que o culto seja em Betel ou Jerusalém? Será que podemos com toda a sinceridade acreditar que tal atitude é manifestação de amor? Oxalá não pensemos que agradar a todos seja sinal de amor. Não existe tal coisa. O médico pode amar seu paciente e ter por ele grande simpatia, mas não pode dizer ao enfermo que está bem. Se disser ao doente que não tem nada, demonstrará com isto sua incompetência como médico: seus olhos não podem ver. Da mesma forma, o profeta velho — embora vivesse em Betel — não podia ver que havia pecado em Betel. O pecado estava perante seus olhos, mas ele não tinha sensibilidade. A que ponto chegara sua incompetência! E quão trágica e terrível foi!
O estado do profeta velho era realmente patético mas o que foi mais patético e trágico foi o fato do homem de Deus ter sido prejudicado pelo profeta velho. O Senhor havia ordenado ao homem de Deus: "Ali não comerás pão, nem beberás água; nem voltarás pelo caminho por que foste" (l Reis 13:17). O homem de Deus lembrou-se deste mandamento e rejeitou o primeiro convite do profeta velho e também o convite do rei. Mas o homem de Deus foi enganado pelas palavras do profeta velho quando este último lhe disse: "Também eu sou profeta como tu, e um anjo me falou por ordem do Senhor, dizendo: Faze-o voltar contigo a tua casa, para que coma pão e beba água" (v. 18). O homem de Deus pensou que se o profeta velho fosse profeta certamente tinha mais experiência do que ele; portanto devia obedecer-lhe. E assim, ele voltou com o profeta velho e comeu e bebeu água na casa deste. Desta forma o homem de Deus violou o mandamento do Senhor por causa das palavras do profeta velho. Resultado: o homem de Deus foi morto por um leão. A princípio as palavras de Deus lhe eram perfeitamente claras; mas tornou-se confuso depois de ouvir as palavras: "Também eu sou profeta." Desta passagem podemos tirar um ensinamento mui solene: depois que a pessoa que serve ao Senhor recebe um mandamento claro, não deve dar ouvidos a nenhum profeta velho cujas palavras não estejam de acordo com o mandamento de Deus.
As palavras que Paulo ordenou aos crentes Gálatas seguem o mesmo princípio: "Ainda que nós, ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema" (Gálatas 1:8). O evangelho que ele pregava não era segundo os homens mas veio da revelação de Jesus Cristo (veja 1:11-12). Mas chegaram alguns à Galácia que tentavam perverter o evangelho. Estes homens pregavam outro evangelho aos crentes Gálatas. Pelo que Paulo advertiu aos cristãos daí a não serem seduzidos por eles. Paulo viu que estes enganadores apresentavam-se com o pseudónimo de "servos de Deus" e que de fornia inteligente usavam uma fraseologia espiritual para confundir os santos. De modo que ele, usando palavras duras, advertiu as igrejas da Galácia.
Mas note que Paulo também disse "ainda que nós" — o que significava: ainda que eu, Paulo, viesse e lhes pregasse um evangelho diferente do que sempre preguei, não devem crer nesse evangelho. Vocês devem crer somente no evangelho vindo mediante a revelação de Jesus Cristo; não devem crer em nome tal como Paulo; porque no caso de eu, Paulo, mais tarde pregar-lhes um evangelho que contradiz a revelação de Deus que lhes dei antes, vocês não devem crer em tal evangelho. Ele sabia muito bem que muitos são facilmente influen-ciados pela fama dos homens. E com que ligeireza criam na fama do homem em vez de crerem na palavra de Deus. Portanto, Paulo aqui expressou a atitude de que ficaria absolutamente do lado da verdade de Deus, sem deixar nenhuma oportunidade para outros, nem sequer para ele mesmo. Ele queria que eles cressem totalmente na verdade de Deus e não na fama do homem. Ele lutava valorosamente pela verdade — tudo para Deus e nada para si mesmo. O que ele mantinha era a verdade de Deus: ele não preservaria sua própria fama. Sua oposição aos sedutores tinha como motivo o fato de eles confundirem a palavra do Senhor e levarem os crentes para o erro. Desta forma Paulo mostrou-nos que devemos ficar do lado da verdade de Deus para que possamos distinguir que palavra devemos aceitar ou rejeitar. Se qualquer pessoa pregar o que é contrário à verdade de Deus, devemos não dar-lhe ouvidos — não importa quem essa pessoa seja.
Paulo prossegue dizendo: "ou um anjo do céu", e assim lembrou-lhes que nem sequer a palavra de um anjo deveriam ter como certa. Ao falar de falsos apóstolos em 2 Coríntios 11, Paulo disse: "Porque os tais são falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, transfor-mando-se em apóstolos de Cristo. E não é de admirar; porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus próprios ministros se transformem em ministros de justiça; e o fim deles será conforme as suas obras" (vv. 13-15). "Um anjo de luz" usa uma máscara de hipocrisia que facilmente faz com que as pessoas deixem de vigiar. Como podiam os crentes Gálatas, que uma vez tinham ouvido o evangelho do Senhor, ser engodados por estes homens? Porque estes homens diziam que o que pregavam também era o "evangelho" e que pretendiam guardar com zelo a lei de Deus. Tinham algumas palavras de grande apelo com as quais engodaram os Gálatas que anteriormente haviam ouvido a verdade. Desgraça-damente esta espécie de sedutores muitas vezes penetra na igreja e destrói a fé dos homens. Tais sedutores tentam separar as pessoas da palavra de Deus. Precisamos estar sempre vigilantes e sempre em guarda. O motivo pelo qual podem engodar as pessoas é porque também podem fingir-se espirituais, também podem falsificar um amor pelo Senhor, e usar expressões como "a revelação de Deus" e "a vontade de Deus" e assim por diante. São capazes de pregar mensa-gens com tal ambiguidade que é extremamente difícil para as pessoas distinguirem a falsidade da verdade.
Quão realmente precisamos ter um espírito alerta e um poder de discernimento para que possamos ser totalmente fiéis à palavra de Deus, guardando a fé que uma vez nos foi dada! Devemos resistir a todo e qualquer assim chamado "evangelho" que tenta confundir a palavra do Senhor, sem levar em conta quem o pregue.
Este profeta velho não tinha nenhuma sensibilidade ao pecado enorme que Jeroboão havia cometido, e mesmo assim usava a palavra e título de "profeta" para enganar os outros. Tinha perdido, havia muito, a comunhão com Deus, mas falsamente ainda reivindicava que "um anjo falou-me pela palavra do Senhor" (l Reis 13:18). O fracasso do homem de Deus foi em não guardar p palavra que havia recebido pessoalmente de Deus; em vez disso, foi sacudido pelo pretensioso nome do profeta velho e aceitou a mentira proferida pelo velho. Desta forma ele caiu e seu fim foi muito trágico.
O profeta velho tinha caído ao ponto de mentir para enganar o homem enviado de Deus. Enquanto estavam à mesa, a palavra do Senhor lhe veio. Mas isto não aconteceu porque o profeta velho havia-se tornado espiritual de novo. De modo algum. Esta simplesmente foi a maneira do Senhor corrigir o homem de Deus que havia desobe-decido ao seu mandamento. O Senhor não tinha mais nada que fazer com o profeta velho; colocara-o à parte por completo. E quando o homem de Deus foi morto por um leão, o profeta velho o enterrou em sua própria sepultura. Logo encarregou a seus filhos que quando ele morresse o enterrassem com o homem de Deus. Ele cria que a palavra que o homem de Deus havia pronunciado contra o altar de Betel se cumpriria, mas ele não podia fazer outra coisa senão esperar a morte.
Aprendamos desta solene e patética história os seguintes ponto: (1) que no momento em que o homem perde a comunhão com Deus, fica velho, perde o frescor e não pode ver; (2) que uma pessoa que antes fora usada por Deus, mas que agora está longe do Senhor, não deve fazer-se passar por "autoridade antiga" para enganar os outros; (3) que o homem que viola a palavra do Senhor e se encontra em um lugar onde não deve, morrerá: a morte espiritual; e (4) que tudo o que se anuncia de forma espiritual deve estar de acordo com a palavra de Deus; se assim não for, deverá ser firmemente rejeitado, sem se levar em conta quem o esteja anunciando, quer seja um profeta "velho" ou um anjo.
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