Tudo começou em 2008, quando o então governador de São Paulo, José Serra, instituiu um grupo de trabalho para avaliar como suprir o aumento na demanda por água nos próximos anos. A Agência Nacional de Águas (ANA), em seu Atlas divulgado neste mês de março, estima que o estado precisará de mais 60 m³ por segundo de água até 2035 – um aumento da ordem de 25% no consumo. Uma fonte extra não será suficiente e, além do Rio Paraíba do Sul, o governo paulista procura alternativas de abastecimento nas bacias de Piracicaba, na região de Jundiaí; de Ribeira do Iguape, no litoral sul do estado; do alto do Paranapanema, em Itapetininga; e do Alto Tietê, na Baixada Santista.
Os estudos ficarão prontos até o final deste ano, segundo o governo de São Paulo. Se optar por usar a água do Paraíba do Sul, o estado paulista terá de pedir autorização à ANA, que arbitra conflitos entre estados e é responsável por autorizar o uso de recursos hídricos em rios federais.
“Para estudar qualquer pedido de outorga de água, primeiro verificamos se a bacia tem condições de manter os usos de hoje e dos próximos 35 anos, para garantir o abastecimento de quem depende da bacia”, afirma ao iG o superintendente de regulação da agência reguladora, Francisco Lopes Viana. Segundo ele, é comum que estados briguem pela água e a tendência é que haja cada vez mais casos deste tipo. A ANA divulgou recentemente que mais da metade dos municípios poderá ter problemas de abastecimento de água até 2015, mesmo sendo o Brasil um dos países com o maior volume de água do mundo. A razão pela briga é que os rios são mal distribuídos geograficamente.
Favorável em outros casos
Outros estados já brigaram pela água, como a Paraíba com o Rio Grande do Norte, pelas águas do Piranhas Açu, em 2006. Ceará e Piauí também travaram disputa pelo Rio Poti-Longá, em 2008. O caso mais polêmico foi o da transposição do São Francisco, que também passou pelo crivo da ANA antes de ser iniciada. Em todos estes casos, a ANA foi favorável à divisão das águas entre estados, entre outros motivos, para beneficiar o maior número possível de pessoas.
A presidente do Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul, Marilene Ramos, não demonstra simpatia pela ideia de fazer do rio fonte de água dos dois maiores centros urbanos do País. Também presidente do Instituto Estadual do Meio Ambiente (Inea) do Rio, ela afirma que há municípios paulistas banhados pelo rio, no Vale do Paraíba do Sul, que já sofrem com escassez, a exemplo de Taubaté. E lembra o Rio Paraíba do Sul já sofre uma grande transposição para abastecer quase boa parte da região metropolitana do Rio. Segundo ela, duas transposições num mesmo rio podem trazer impactos tanto para o abastecimento de água já existente como para o meio ambiente.
Boa parte das águas do Paraíba do Sul já é transposta para o Rio Guandu, que, por sua vez, abastece 9 milhões de pessoas. Outros 5 milhões de usuários das águas do Paraíba do Sul encontram-se nos municípios banhados pelo rio, que faz um percurso de 1,137 km de extensão pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
A quantidade de água do Paraíba do Sul destinada ao sistema Guandu é da ordem de 160 m³, de acordo com a disponibilidade do Rio Paraíba, segundo Marilene. A vazão total do rio, segundo ela, é de 250 m³ por segundo. Além de ser a maior fonte de água do estado, abastecendo mais de 80% da população, o rio também gera eletricidade para a distribuidora Light.
Indagado se os estudos de São Paulo contemplam o uso de 20 m³ por segundo do Paraíba do Sul, conforme rumores, o secretário-adjunto da Secretaria Estadual de Saneamento de São Paulo, Rogério Menezes, não confirma a informação.
Além de buscar novas fontes de água, o governo de São Paulo tem projetos para a redução de desperdício de recursos hídricos e para a recuperação de várzeas no Rio Tietê. A preocupação é garantir o abastecimento a região chamada de macrometrópole, que abrange Campinas, Baixada Santista e São José dos Campos, além da capital, num total de 30,8 milhões de pessoas. São consumidos cerca de 225 m³ por segundo na região.
“A preocupação do governo é ter absoluta certeza de que não vai faltar água”, diz Menezes. “Não temos pressa, estamos analisando isso com muito cuidado. O estado de São Paulo vai considerar que o Rio Paraíba do Sul já abastece o Rio”, acrescenta ele.
O presidente da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) do Rio, Wagner Victer, avalia que o estudo de São Paulo sobre o Rio Paraíba do Sul ainda vai “dar pano para manga”. “Isso terá que ser muito bem discutido; é uma questão muito delicada e polêmica”, avalia.
Fonte: Ultimo Segundo / Foto: Daniel Rezende
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