A cerca de 10 quilômetros da conhecida avenida Nove de Julho, no coração de Buenos Aires, na Argentina, fica localizada a estreita rua Membrillar, no bairro das Flores. Há 76 anos, Nelly Chiappe segurou em seus braços um novo morador daquela rua, um menino de uma família vizinha que acabara de nascer e que se tornaria, décadas depois, o primeiro Papa do continente americano: Jorge Mario Bergoglio.
Em seu velho sobrado bem na esquina com a rua Espartaco, Nelly, 86 anos, recebeu a reportagem do Terra para falar sobre o papa Francisco, com quem ela passou muitos anos de sua juventude. Bergoglio, que hoje é ativo na defesa contra a homossexualidade e o casamento entre pessoas do mesmo sexo, em outros tempos não era diferente: “ele dizia que era uma aberração”, relembrou a velha amiga.
Após descrever-se como uma católica não praticante, Nelly mostrou um retrato de seu casamento, que aconteceu há 58 anos, para ressaltar os valores da família tradicional. “É um disparate (o casamento gay). A imagem de pai e mãe é sagrada”, criticou ela, ao atacar também a instabilidade das uniões de hoje. “As pessoas casam e se separam logo depois”, completou.
Durante toda a conversa, Nelly não deixou de destacar a simplicidade do ex-vizinho, que nasceu “magrinho e feio”, detalhou ela, aos risos. Quando os dois eram crianças, as ruas do bairro das Flores ainda eram de terra e eles gostavam de brincar nas redondezas. “Ele era uma criança normal”, relembrou ela, ao contar que Bergoglio também passava bastante tempo no armazém do avô, que ficava na rua ao lado.
Segundo Nelly, o pai de Bergoglio era contador de uma fábrica localizada no bairro, enquanto sua mãe era dona de casa e cuidava dele e dos quatro irmãos. O sobrado de arquitetura colonial em que moravam, por sua vez, era bem diferente na década de 1930. “Foi totalmente reformado”, explicou ela, contando ainda que ele estudou no colégio Nuestra Señora de la Misericordia e que frequentou a paróquia Santa Francisca Javier Cabrini, antes de receber sua primeira comunhão.
Surpresa com a indicação do amigo para o posto máximo da Igreja Católica, Nelly relembrou ainda que os dois se encontraram por acaso há alguns anos, na praça Misericórdia, próximo a sua casa, quando Bergoglio já havia sido nomeado cardeal pelo papa João Paulo II, em 2001.
“Ele estava com uma malinha e pediu para que eu não o chamasse de cardeal”, contou. A notícia de sua nomeação como Papa, segundo ela, foi recebida com muitas lágrimas e comoção. “Não imaginava, pois ele é de uma família muito simples e honesta”, elogiou a senhora, ao ressaltar a sua crença de que Bergoglio manterá seus hábitos simples durante seu papado.
Nascido em 1936, Bergoglio se tornou padre em 1958 e cardeal em 2001. Ele se tornou, na última quarta-feira, o primeiro Papa jesuíta e não nascido na Europa.
TERRA
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