Exultante ao celebrar a Ceia do Senhor, o arcebispo anglicano de Uganda, Henry Orombi, não se conteve: “É uma alegria ver que o céu começa a aqui!” A afirmação expressa bem o sentimento que tomou conta dos 4 mil participantes do III Congressio Mundial de Evangelização, realizado entre 17 e 25 de outubro de 2010 na Cidade do Cabo, África do Sul. Durante nove dias, representantes da Igreja Evangélica global, oriundos de 198 países, discutiram a fé cristã contemporânea, os desafios da religião ante a agenda da modernidade e os rumos da obra missionária. Mas a tônica do encontro foi o reconhecimento à consolidação de um novo modelo de Igreja, em que os polos de influência têm migrado do Primeiro Mundo para regiões menos privilegiadas economicamente, mas onde a fé tem experimentado avanço muito maior.
Por conta da presença de gente como Orombi, a atmosfera do congresso Lausanne III foi de descoberta contínua. À volta das centenas de mesas de discussão que se formavam após cada plenária, crentes das mais diversas origens expressavam a diversidade de um mundo cada vez mais globalizado – lembrando, de maneira inequívoca, a expressão bíblica que fala em discípulos de “todas as tribos, povos e raças”. O centro de convenções da Cidade do Cabo foi, durante pouco mais de uma semana, o coração e o cérebro da Igreja evangélica mundial.
Os líderes presentes a Cape Town 2010 saíram da África do Sul com a certeza de que é hora de discutir, da maneira mais plural possível, a natureza da missão cristã. “Vamos manter a estrada aberta e deixar o diálogo fluir. Só assim vamos aprender uns com os outros sobre como participar na missão de Deus respeitando os outros como membros do mesmo Corpo de Cristo”, salientou o pastor norueguês Olav Fyske Tveit, secretário-geral do Conselho Mundial de Igrejas. “Somos chamados a ser um, para que o mundo creia que Deus reconcilia o mundo em Cristo”, pregou, lembrando o lema do evento.
Já na noite de abertura do congresso, o presidente-executivo do Comitê Lausanne, Doug Birdsall, recepcionou os participantes lembrando a relevância do momento: “Os resultados deste congresso estarão na forma como todos nós olhamos para Deus e como isso pode ajudar a mudar o curso da evangelização do mundo para as próximas décadas”. O executivo também enfatizou a urgência de desenvolver a tolerância e amizade entre a família evangélica mundial: “O Evangelho da reconciliação é o que nos une”.
“Capacidade de se maravilhar” – Intencionalmente programado para evitar o destaque a personalidades, Cape Town 2010 não assistiu pregações arrebatadoras. As falas de ícones do pensamento teológico presentes, como Os Guinness, René Padilla, John Piper, Samuel Escobar e Michael Herbst chamaram a atenção mais pelo conteúdo, e não pelos preletores. A cada manhã, todos participavam de devocionais e momentos de reflexão bíblica sobre a Epístola de Paulo aos Efésios em pequenos grupos, onde era possível ouvir, tocar e orar por gente que, muito provavelmente, não se encontrará novamente nesta vida. Em um deles, o pastor cingalês Ajith Fernando foi extremamente feliz na conclusão: “Quando perdemos a capacidade de nos maravilhar com o Evangelho, perdemos o foco e, consequentemente, a razão de viver e ser Igreja na história.”
Naturalmente, nem tudo saiu conforme o previsto no III Congresso Lausanne. A começar pela ausência dos quase 200 membros da delegação chinesa, impedidos de viajar na última hora pelo governo de seu país. As cadeiras vazias na plenária foram lamentadas por todos os presentes por representar o desperdício de um rico diálogo com líderes de uma das igrejas nacionais que mais crescem no mundo. E o grandioso sistema GlobaLink, programado para levar Cape Town 2010 em tempo real para 95 países, por pouco não entrou em colapso. Um ataque maciço de hackers praticamente tirou do ar, nos dois primeiros dias, os 700 pontos da rede. Quem salvou a pátria foram Vilay Kumar e Daniel Singh, dois pastores indianos especializados em computação que viajaram à África do Sul como voluntários para ajudar no sistema de impressoras da conferência. Eles conseguiram restabelecer a comunicação externa via internet. “Creio que Deus, em sua soberania, os trouxe até nós”, respirou aliviado Joseph Vijayam, presidente de Tecnologia do Movimento Lausanne.
Outro detalhe do congresso foi o pouco espaço dado aos preletores latinoamericanos, fato que desagradou os 59 brasileiros presentes. “Cremos que o Brasil e a América Latina têm muito que dizer e contribuir à missão mundial da Igreja”, opina o pastor presbiteriano Ricardo Agreste, integrante da delegação. Além disso, os delegados ficaram constrangidos pela maneira como a região foi retratada na apresentação preparada pela organização. “Falaram apenas de pobreza, violência e corrupção”, reclama Agreste. “Mas não é só isso que caracteriza nosso continente e nosso país.”
Contudo, os pastores e líderes brasileiros também tiveram momentos marcantes. O grupo entregou um manifesto aos representantes da África, emocionante documento em que pediam perdão pelas atrocidades cometidas no passado do Brasil contra os escravos negros. “Precisamos pedir a vocês perdão por algo imperdoável. Por favor, perdoem os pecados do nosso povo contra vocês. Perdoem os pecados de nossa nação contra as nações de vocês”, diz um trecho. Agreste diz que os dias na Cidade do Cabo o fizeram refletir “Ouvindo acerca do sofrimento de muitos cristãos em outros países e vendo a alegria deles em se relacionar com outros irmãos, sinto-me envergonhado com a forma como, muitas vezes, lidamos com nossos relacionamentos e a facilidade com que rompemos com nossas comunidades.”
NÚMEROS
4 mil congressistas, 198 nações representadas, 59 brasileiros participaram do evento, 400 sites transmitiram o evento em tempo real
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Cristianismo Hoje - Por Tim Stafford
Por conta da presença de gente como Orombi, a atmosfera do congresso Lausanne III foi de descoberta contínua. À volta das centenas de mesas de discussão que se formavam após cada plenária, crentes das mais diversas origens expressavam a diversidade de um mundo cada vez mais globalizado – lembrando, de maneira inequívoca, a expressão bíblica que fala em discípulos de “todas as tribos, povos e raças”. O centro de convenções da Cidade do Cabo foi, durante pouco mais de uma semana, o coração e o cérebro da Igreja evangélica mundial.
Os líderes presentes a Cape Town 2010 saíram da África do Sul com a certeza de que é hora de discutir, da maneira mais plural possível, a natureza da missão cristã. “Vamos manter a estrada aberta e deixar o diálogo fluir. Só assim vamos aprender uns com os outros sobre como participar na missão de Deus respeitando os outros como membros do mesmo Corpo de Cristo”, salientou o pastor norueguês Olav Fyske Tveit, secretário-geral do Conselho Mundial de Igrejas. “Somos chamados a ser um, para que o mundo creia que Deus reconcilia o mundo em Cristo”, pregou, lembrando o lema do evento.
Já na noite de abertura do congresso, o presidente-executivo do Comitê Lausanne, Doug Birdsall, recepcionou os participantes lembrando a relevância do momento: “Os resultados deste congresso estarão na forma como todos nós olhamos para Deus e como isso pode ajudar a mudar o curso da evangelização do mundo para as próximas décadas”. O executivo também enfatizou a urgência de desenvolver a tolerância e amizade entre a família evangélica mundial: “O Evangelho da reconciliação é o que nos une”.
“Capacidade de se maravilhar” – Intencionalmente programado para evitar o destaque a personalidades, Cape Town 2010 não assistiu pregações arrebatadoras. As falas de ícones do pensamento teológico presentes, como Os Guinness, René Padilla, John Piper, Samuel Escobar e Michael Herbst chamaram a atenção mais pelo conteúdo, e não pelos preletores. A cada manhã, todos participavam de devocionais e momentos de reflexão bíblica sobre a Epístola de Paulo aos Efésios em pequenos grupos, onde era possível ouvir, tocar e orar por gente que, muito provavelmente, não se encontrará novamente nesta vida. Em um deles, o pastor cingalês Ajith Fernando foi extremamente feliz na conclusão: “Quando perdemos a capacidade de nos maravilhar com o Evangelho, perdemos o foco e, consequentemente, a razão de viver e ser Igreja na história.”
Naturalmente, nem tudo saiu conforme o previsto no III Congresso Lausanne. A começar pela ausência dos quase 200 membros da delegação chinesa, impedidos de viajar na última hora pelo governo de seu país. As cadeiras vazias na plenária foram lamentadas por todos os presentes por representar o desperdício de um rico diálogo com líderes de uma das igrejas nacionais que mais crescem no mundo. E o grandioso sistema GlobaLink, programado para levar Cape Town 2010 em tempo real para 95 países, por pouco não entrou em colapso. Um ataque maciço de hackers praticamente tirou do ar, nos dois primeiros dias, os 700 pontos da rede. Quem salvou a pátria foram Vilay Kumar e Daniel Singh, dois pastores indianos especializados em computação que viajaram à África do Sul como voluntários para ajudar no sistema de impressoras da conferência. Eles conseguiram restabelecer a comunicação externa via internet. “Creio que Deus, em sua soberania, os trouxe até nós”, respirou aliviado Joseph Vijayam, presidente de Tecnologia do Movimento Lausanne.
Outro detalhe do congresso foi o pouco espaço dado aos preletores latinoamericanos, fato que desagradou os 59 brasileiros presentes. “Cremos que o Brasil e a América Latina têm muito que dizer e contribuir à missão mundial da Igreja”, opina o pastor presbiteriano Ricardo Agreste, integrante da delegação. Além disso, os delegados ficaram constrangidos pela maneira como a região foi retratada na apresentação preparada pela organização. “Falaram apenas de pobreza, violência e corrupção”, reclama Agreste. “Mas não é só isso que caracteriza nosso continente e nosso país.”
Contudo, os pastores e líderes brasileiros também tiveram momentos marcantes. O grupo entregou um manifesto aos representantes da África, emocionante documento em que pediam perdão pelas atrocidades cometidas no passado do Brasil contra os escravos negros. “Precisamos pedir a vocês perdão por algo imperdoável. Por favor, perdoem os pecados do nosso povo contra vocês. Perdoem os pecados de nossa nação contra as nações de vocês”, diz um trecho. Agreste diz que os dias na Cidade do Cabo o fizeram refletir “Ouvindo acerca do sofrimento de muitos cristãos em outros países e vendo a alegria deles em se relacionar com outros irmãos, sinto-me envergonhado com a forma como, muitas vezes, lidamos com nossos relacionamentos e a facilidade com que rompemos com nossas comunidades.”
NÚMEROS
4 mil congressistas, 198 nações representadas, 59 brasileiros participaram do evento, 400 sites transmitiram o evento em tempo real
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Cristianismo Hoje - Por Tim Stafford
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