Pesquisa recente realizada com base em dados do Ministério da Saúde e do IBGE traz informações com índices estatísticos aterradores no que se refere ao assassinato de adolescentes e jovens entre 12 e 18 anos no Brasil. E no epicentro deste conflito, como ponto da superfície da terra diretamente acima do foco de um terremoto de grandes proporções estão o Estado e a cidade do Rio de Janeiro. A pesquisa considera as 267 cidades com mais de 100 mil habitantes e constata que 33.504 jovens de 12 a 18 anos serão vítimas de assassinato entre 2006 e 2012 no Brasil, caso as taxas de homicídio de 2006 permaneçam inalteradas. De todos os jovens mortos em 2006, 45% foram vítimas de assassinato. Se levarmos em consideração somente os dados relativos à cidade do Rio de Janeiro, veremos que sozinha responde pelo maior número absoluto dentre as demais cidades pesquisadas no país: 3.423 (10% do total) de jovens com menos de 19 anos morrerão até 2012. Com relação ao restante do Estado do Rio, os fatos apontam que 4.402 adolescentes entre 12 e 18 anos vão morrer em sete anos apenas em quatro cidades: Caxias, Itaboraí, Cabo Frio e Rio de Janeiro. A cidade de Resende aparece com o maior risco de homicídio à mão armada contra jovens no estado. A gravidade do quadro apresentado sobre assassinato de jovens e adolescentes em nosso Estado torna-se ainda mais claro se o compararmos com os dados referentes à cidade de São Paulo levantados pela mesma pesquisa. São Paulo, a maior cidade do país, tinha 1.404.014 adolescentes de 12 a 18 anos em 2006, contra 696.242 no Rio. Mesmo tendo mais do que o dobro da população de jovens, São Paulo registrou quase metade das vítimas. O levantamento projeta que 3.423 jovens cariocas serão assassinados até 2012 ante 1.992 paulistas, caso as taxas de 2006 não sofram alteração. Estes dados demonstram ainda que a morte alcança nossos jovens não de forma igualitária, atingindo a todos indiscriminadamente. Ela se dá de forma seletiva, assumindo contornos que chegam a ter requintes de crueldade. A probabilidade de ser vítima não é a mesma para toda a população. Rapazes tem 11,91 vezes mais risco do que moças; negros, 2,6 vezes mais risco do que brancos. A faixa etária com maior incidência de assassinatos vai dos 19 a 24 anos. Se compararmos os fatos descritos até aqui com as estatísticas carcerárias, veremos que os que lotam nossos cárceres são em sua quase totalidade também jovens de 19 a 24 anos, homens, negros, pardos e com nível escolar fundamental incompleto. A conclusão clara que advém dos fatos, para sabermos como tratamos a juventude e a pobreza, é que, ao lado dos discursos oficiais, nós matamos os nossos jovens pobres (ou permitimos que sejam mortos), e criminalizamos a pobreza. Fenômeno este que atinge não só o Brasil, mas se dá em escala mundial. Dada a gravidade dos fatos relativos à morte de nossos jovens e adolescentes, nos perguntamos: Por que estas mortes não despertam grandes comoções em meio à opinião pública? A resposta lógica é: porque as vítimas são rapazes pobres, negros e da periferia. A pesquisa aponta também que as ações que visem à prevenção da violência devem começar mais cedo. Na faixa de 0 a 11 anos quase não há assassinatos de crianças, mas o quadro muda radicalmente depois. Antes de ser um fora da lei, o adolescente foi abandonado pela lei. A evasão escolar está na ponta do problema. Além da ação do Estado através de políticas públicas que ataquem o problema de forma mais eficaz, a participação de toda a sociedade, em especial da Igreja, se faz necessária. • Por que devemos nos envolver com este problema? Uma leitura simples do evangelho nos dá a resposta para esta pergunta. Em Mateus, Jesus nos afirma que atendendo as necessidades humanas em suas mais variadas formas (vestindo os nus, visitando os encarcerados, alimentando os famintos etc.) estaríamos atendendo ao próprio Senhor Jesus e só assim seríamos reconhecidos por Ele como seus discípulos. Ao contrário disto, podemos ter a agenda de nossas Igrejas cheia de atividades “tidas como religiosas e espirituais” (expulsar demônios, curar enfermos, operar sinais e prodígios, etc.), mas se isto não se fizer acompanhar de um encontro verdadeiro com o nosso próximo, exercendo o amor e a misericórdia para com ele, atendendo suas necessidades de forma objetiva e prática conforme a realidade que nos confronta se apresenta, ouviremos do Senhor as seguintes palavras: “Apartai-vos de mim que Eu não vos conheço” (Mateus 25: 31 a 46), enquadrando-nos na descrição feita pelo apóstolo Paulo sobre os que se “dirão” cristão nos últimos dias: “Tendo forma de piedade, negando-lhe, entretanto, o poder” (2Timóteo 3: 1 a 5). Leia os textos e confira. Os ricos exemplos deixados pelo metodismo primitivo demonstram “com a clareza da luz do dia” que envolvimentos e intervenções desta ordem são parte de nossa vocação histórica e a sua ausência acarretará a perda da nossa identidade confessional. A propagação da educação e cultura foi tão importante para John Wesley em toda a sua vida, que a Enciclopédia Britânica cita a seu respeito: “Nenhum homem fez tanto no século dezoito, para criar o gosto pela boa leitura e para prover livros aos mais baixos preços”. 1 A preocupação com as crianças e com sua educação formal está presente de forma latente em toda a história do metodismo. Ainda no período do Clube Santo, na Universidade de Oxford, quando o movimento metodista dava os seus primeiros passos, já havia ações neste sentido. “Os Metodistas de Oxford estabeleceram uma escola para crianças pobres. Com o seu dinheiro e com alguma ajuda de fora, pagavam a professora, e até ajudavam a vestir as crianças. Numa época quando não existiam escolas públicas e quando os pobres eram esquecidos pela Igreja, Wesley e os seus companheiros se mobilizaram para ensinar as primeiras letras para os pobres da redondeza, proporcionado-lhes também os rudimentos da religião, como então a compreendiam.” 2 Anos mais tarde, com o movimento já organizado em sociedades, pondo-se na Inglaterra ao redor das cidades de Londres, Bristol e Newcastle-on-Tyne, em todos estes centros se estabeleceram sociedades fortes com propriedades amplas onde eram desenvolvidas muitas atividades. A educação e o cuidado de crianças tinham prioridade, nunca sendo esquecidos, principalmente para os filhos dos rudes e pobres mineiros de carvão como nos lembra o Rev. Duncan Reily: “Em todas as localidades havia escolas onde as crianças eram ensinadas, e, até um certo ponto, hospedadas. Além das crianças que recebiam instrução no chamado “Salão Novo” de Bristol, bem perto se estabeleceu a escola Kingswood para os filhos dos pobres mineiros de carvão, que se tornaram tão importantes na vida do Metodismo no seu começo.” 3 Durante 50 anos, até o final de sua vida, John Wesley lutou com todas as suas forças e empenho para que a escola de Kingswood, destinada principalmente para que os filhos dos operários das minas de carvão recebessem ensino, permanecesse ativa. Também no Centro Metodista de Newcastle havia uma escola em que John Wesley dispensou grande amor e energia, e segundo o que ele mesmo escreveu, seria estabelecido “uma escola para 40 crianças pobres com um professor. No mesmo local, organizou-se mais tarde, uma “escola diurna mista de criancinhas” e uma “escola Industrial feminina”. 4 Não devemos nos esquecer de que estavam no período histórico conhecido como revolução industrial, marcado pela miséria e concentração de renda. E no sentido de desenvolver ações que diminuíssem o grande fosso que cada vez mais separava ricos e pobres na Inglaterra, motivados por um genuíno avivamento espiritual, os metodistas daquele período souberam agir com fidelidade ao evangelho, amor e coragem, pois sabiam que no “novo céu e nova terra” prometidos no livro de apocalipse os covardes não poderão entrar. (apocalipse 21: 8). E hoje? Miraremo-nos neste exemplo ante ao desafio que nos está posto, quanto ao atendimento às crianças e adolescentes sentenciados à morte em nossas comunidades, respondendo com a mesma coragem e dignidade dos primeiros metodistas? Lembremo-nos do Plano para a Vida e Missão da Igreja Metodista quando faz referência às necessidades e oportunidades para que a missão, que deve ser exercida pela Igreja neste século, chegue a bom termo: “A missão acontece quando a Igreja sai de si mesma, envolve-se com a comunidade e se torna instrumento da novidade do Reino de Deus (Mt 4.16-24, 2.18-20). A luz do conhecimento da Palavra de Deus, em confronto com a realidade discernindo os sinais do tempo presente a Igreja trabalha, assumindo os dramas e esperanças do nosso povo ( I Co 5.17-21; Ap 21.1-8; Is 43.14-21; II Tm 2.9-10).” 5 • O quê e como fazer? Atuar no sentido de envolver nossas Igrejas Locais para a implantação de turmas de reforço escolar (e fortalecendo aquelas que já existem) com as crianças da comunidade em que a Igreja está inserida é uma ação simples e eficaz na produção de resultados preventivos, no que se refere a diminuir as taxas de assassinatos entre jovens. O próprio espaço físico destinado ao culto dominical (se não houver salas de aula apropriadas) com pouca ou nenhuma adaptação, alguma irmã ou irmão doando seu tempo de forma voluntária (com um pequeno treinamento, em alguns casos), o amor e boa vontade da congregação e o envolvimento da pastora/pastor somados são a fórmula necessária para que tenhamos êxito nesta obra missionária para com as crianças. Estas que são os primeiros e o exemplo no caminho de acesso ao Reino de Deus, segundo Cristo Jesus (Ele que era o próprio Reino) “Jesus, porém, chamando-as para junto de si, ordenou: Deixai vir a mim os pequeninos e não os embaraceis, porque dos tais é o Reino de Deus. Em verdade vos digo: Quem não receber o Reino de Deus como uma criança, de maneira alguma entrará nele”. (Lucas 18: 16 e 17) Pastor Edvandro Machado Secretário Executivo de Ação Social da Igreja Metodista - 1 Reg. pastoralcarceraria@metodista-rio.org.br edvandromachado@uol.com.br Via: Portal Metodista |
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quarta-feira, 24 de novembro de 2010
Assassinato de Adolescentes e Jovens: Causa Missionária da Igreja
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